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Marca x Comunidade: Um relacionamento verdadeiro que influencia vendas e deixa legado.

Em 2018 eu fui convidada a tocar uma área chamada Cultura & Relacionamento para marcas de cervejas como Budweiser, Becks e Corona no Nordeste.

Relacionamento marca x comunidade - Ilustração de garota com Budweiser na mão

Muitos colegas da época ainda não fazem ideia do que o nome da vaga queria dizer. Para eles, eu era Gerente de influenciadores. Sim, eu lidava com essa galera. Mas com a experiência que adquiri naquele ano, posso te dizer que a estratégia era muito maior do que enviar produto para casa de pessoas legais e tinha muito mais a ver com criar cultura através de uma ferramenta antiga e poderosa: o relacionamento.

E como se relacionar virou uma arte em alta no mundo dos negócios, eu vou dividir o que eu aprendi sobre o envolvimento entre marcas e comunidades, o porquê isso gera vendas e deixa legado.


Mercado de Influência: quem influencia o quê?


O primeiro que eu diria aos meus colegas é que se engana quem pensa que o mercado de influência é algo novo e começou com o Youtube e o Instagram. Essas relações são antigas, desde que gente é gente. E gente gosta de saber a opinião do outro. Se esse outro é especialista em alguma coisa, essa opinião vale muitos dinheiros.

Redes Sociais - Ilustração de smartphone com mão rolando o feed do instagram

As redes sociais, que têm exatamente o objetivo de socialização, só enfatizaram ainda mais o quanto gostamos de saber como vivem, o que comem e o que vestem os nossos vizinhos. O fato é que agora o mundo inteiro pode ser o cara que mora ao lado. Literalmente espiamos a janela da casa de quem a gente quiser sem barreiras geográficas, basta ter o @. Mas, para realmente nos influenciar a tomar alguma atitude, gosto muito de trabalhar com a ideia que essa pessoa precisa ser um dos três eleitos que o livro O ponto da virada (Malcom Gladwell, 2009), descreve:

  1. Comunicadores – Esses conhecem muita gente. São pessoas cujo círculo social são 4 ou 5 vezes maiores que a média. Eles têm um talento natural de fazer amigos e construir relações sociais. Possivelmente, é uma pessoa que valoriza e tem prazer com os encontros casuais. A gente consegue encontrar esse tipo de pessoa já na nossa infância, é aquele colega que circula em qualquer panelinha. Esse cara quando crescer poderá influenciar muita gente a tomar uma ação, pela sua facilidade de circular entre uma grande e variada quantidade de pessoas. O comunicador é o cara que começa a propaganda boca a boca.

  2. Experts – Estas pessoas são aquelas que confiamos para obter informações. Ele é um acumulador de conhecimento. E a partir do momento que ele descobre algo que quase ninguém percebeu, ele quer compartilhar o que sabe. Em geral, as pessoas têm um grau enorme de confiança nesse tipo de pessoa pelo seu interesse genuíno e se ele nos diz para fazer algo, é muito possível que façamos. Talvez sua rede de contatos não seja tão grande quanto a do comunicador, mas por sua palavra ser baseada em conhecimento, seu grau de influência se torna muito maior.

  3. Vendedores – Estes são capazes de nos convencer a agir. Tem uma energia contagiante que nos faz querer concordar com ele. Eles dominam com sutileza tanto pistas verbais, quanto pistas não verbais para nos persuadir. Ao estar em contato com alguém, estabelecem uma coreografia: palavras certas são ditas no tom adequado para convencer algum tipo de pessoa a agir em alguma situação específica, que pode ser a compra de um produto. Entramos no ritmo dos vendedores e somos ditados pelos seus termos de interação.

Apesar desses três tipos de pessoas já estarem entre nós desde que o mundo é mundo, parece que só agora mostramos as cartas de que qualquer pessoa pode ter esse perfil e que sim, queremos sua ajuda para vender nossas marcas. E se é esse o jogo que queremos jogar, ele precisa ser consciente, transparente e ter propósito nessas relações.


Influenciador tem que ser digital?


Outra coisa que aprendi é que pensar nessa pessoa como unicamente um influenciador digital é ignorar que existe muita gente na vida real que movimenta vizinhos, ruas, bairros e cidades sem precisar de um @.

Influenciadores offline deixam legado - Ilustração menina andando de skate

É possível que o profissional de marketing que só se dedicar a encontrar essa pessoa nas redes sociais seja aplacado pela cegueira do filtro das métricas e perca a oportunidade de enxergar os vários personagens que estão criando e engajando comunidades no off-line. Bem ali no mundo real, onde também se deixa legado. Para explicar melhor, é muito menos se a pessoa é um influenciador digital ou não e mais sobre ser alguém que tem uma mensagem tão forte que engaja pessoas a agir (em geral, por algo maior que um produto). Claro que esse movimento também acontece nas redes sociais por ser um canal muito potente de difundir suas ideias.


Quer namorar comigo?


Por isso, para construir um relacionamento verdadeiro, não dá só para escolher um endereço aleatório e mandar um presskit para um desses três sujeitos. Marca e Influenciador precisam se olhar no olho antes. Em geral, o primeiro sabe exatamente a mensagem que precisa reforçar ao consumidor e o segundo sabe exatamente como passar essa mensagem.

Relacionamento marca e influenciador - Ilustração de dois rostos que se multiplicam

Uma das pessoas que conheci na minha jornada em 2018 foi a Malfeitona. Conversei com ela sobre a relação marca x comunidade na visão de alguém que hoje influencia uma rede de quase 100 mil pessoas e contando. Engenheira, pesquisadora e tatuadora de Salvador, ela criou seu estilo artístico “malfeitoso” e uma linguagem própria que encanta e engaja pessoas do Brasil e do mundo afora. Como ela mesmo disse nessa entrevista ao HuffPost,

“Eu vendo uma coisa que, em tese, não tem valor. Só que eu consigo agregar esse valor pela forma com a qual ele é vendido”.

Para Malfeitona, o ponto de virada para ela ser vista como uma referência foi o boom de matérias sensacionalistas sobre tatuagem e ela soube aproveitar positivamente.


Dentre os três eleitos que citei lá em cima, ela pode ser classificada como uma Expert. Aquela pessoa que mostra interesse genuíno sobre algo, questiona modelos e padrões e faz o mais cético se questionar o que pode ou não pode ser considerado arte, por exemplo, com muito poder de argumentação.

Arquétipo de Carl Jung do Rebelde como um dos padrões da psique humana - Ilustração de um homem diabo

Marcas que constroem sua imagem baseada no arquétipo, conceito apresentado por Carl Jung de doze padrões principais da psique humana que simbolizam as motivações humanas básicas, do Rebelde (acredita que regras podem ser quebradas, é ousada, livre e tem como estratégia chocar), por exemplo, tem em Malfeitona uma grande aliada para passar sua mensagem.


Para ela, mimos das marcas (estratégia muito comum nesse mercado) é uma coisa que chega na sua casa e a pessoa não tem obrigação de divulgar, até porque não necessariamente ela queria aquela coisa. Antes de beijar, tem que pegar na mão.


Como manter essa relação gerando vendas e deixando legado?


Meus colegas também me questionavam sobre resultados. Utilizar a estratégia de influenciadores não é garantia de sobrevivência. Seja para posicionamento ou gerar vendas é necessário trilhar um caminho e construir algo genuíno. O que entendi em 2018 é que essas pessoas não são os vendedores da sua marca. Isso é com o time de vendas. Além disso, pegar atalhos e pensar nessas pessoas só no fim do projeto para compor um mix de estratégias é uma cilada: não constrói identidade, ou pior, a marca pode ser considerada ruído para a rede de pessoas que o influenciador impactar. A mensagem se perde no fluxo intenso de informações da internet. Se a estratégia for apenas tática e online, um conteúdo no Instagram, por exemplo, tem validade de apenas 21 horas. Não tem jeito, é necessário construir de fato um relacionamento com transparência e diálogo com essas pessoas, para que o discurso chegue com verdade ao consumidor.


Foi com essa dor que Malfeitona trouxe uma das dicas para esse relacionamento dar certo. Ela entende que ao negociar, as marcas devem deixar claro suas regras e os pontos chaves da mensagem, mas não podem interferir no formato e linguagem do influenciador. Muita restrição ou pedidos, dificultam o resultado e deixam o conteúdo não natural (que é o que de mais precioso existe na entrega de um comunicador, expert ou vendedor).

Fluxo da mensagem entre marca, e consumidor deve ser natural e sem interferencia na linguagem do influenciador - Ilustração de menina nadando em um fluxo natural

Como exemplo, ela citou um caso onde o cliente já lhe pediu para não usar neologismos, aumentativo, palavras que não existem (algo que faz todo sentido para sua rede) na hora de pedir que o seguidor cometa uma ação. Em sua opinião, a linguagem precisa ser espontânea e, se envolver uma marca, ter um gancho no conteúdo que ela está abordando naquele momento. Por isso ter um briefing duas semanas antes é deixar o conteúdo quadrado e menos criativo e natural. Em resumo, sua dica é que confiem no influenciador.


Esse tipo de alinhamento não seria necessário se a escolha das pessoas que vão falar sobre a marca esteja coerente com o tom de voz usado com seus consumidores. Escolher e depois tentar adaptar o discurso é inviabilizar a verdade, prejudicando marca, influenciador e resultado de vendas.


Além disso, compreender que o relacionamento começa com a intenção de ser duradouro e de longo prazo ajuda na sinergia entre produto, mensagem e interlocutor. Se esse relacionamento tem propósito e frutos reais, não é necessário contar histórias. O relacionamento é a própria história e a mensagem flui fácil. E isso nos leva ao próximo questionamento.


Como uma marca pode encontrar sua comunidade?


Esse talvez tenha sido o meu maior aprendizado daquele ano. A comunidade onde a marca vai atuar tem que ser “um caldeirão” de valores, personalidades, arquétipos que ajuda a marca a entregar seu propósito. Digamos que por muito tempo as marcas compravam espaços publicitários para contar histórias sobre os seus produtos. Agora ela cria a história junto com a sua comunidade.

Marcas devem criar história junto com a sua comunidade - Ilustração de garoto e garota ao ar livre fazendo piquenique

Usar a comunidade como um espaço publicitário é perder toda a força colaborativa e criativa que o ser humano tem de fazer coisas acontecerem. Então se o propósito da marca é mostrar através do esporte que todos podem ir além dos seus limites pessoais e fazer acontecer, ela precisa se conectar com pessoas que vivem a vida exatamente com esse lema e apoiar seus projetos ou criar novas iniciativas que façam as pessoas acreditar cada vez mais nessa mensagem.


Cultura e Relacionamento é a arte do business de influência


Por fim, perguntei a Malfeitona como a arte pode ajudar os negócios e a relação marca x comunidade. Ela me disse que a arte cativa e a arte toca.

“Se as pessoas se sentem tocadas e identificadas, elas vão querer consumir. Pessoas consomem festas que vão tocar os artistas que ela gosta. Ela foi lá não pelo ingresso ou pela bebida, e sim pela música, pois é o que a toca”

E no caso dela, e como muita gente que é beta e tem poder de movimentar suas comunidades, a sua arte acabou virando um negócio.


Entendi em 2018 que Malfeitona e tantos outros criam algo que é maior e muito mais valioso que as marcas e suas estratégias de comunicação. Se relacionar com uma comunidade, é mais sobre colaboração e menos sobre números. É sobre ajudar o seu movimento a criar cultura com pessoas e para pessoas através do investimento nesse relacionamento. O legado será percebido pelo consumidor e o produto sairá das prateleiras na mesma proporção.

 
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